.Por Guilherme Boneto.

São baixas as chances de o PT não indicar candidato nas eleições presidenciais de 2018 – desde 1989, os petistas concorreram em todas as sete.

Diante dos espantosos índices de intenção de voto que obtém, é natural que o ex-presidente Lula se apresente como postulante pelo partido.

Acredito, no entanto, que o PT faria um grande bem a si mesmo apoiando um candidato da esquerda e abrindo mão da cabeça de chapa no pleito. Seria uma maneira de resguardar-se e de esfriar essa confrontação horrorosa que há alguns anos toma conta de nosso país. O Brasil já não é o mesmo no pós-junho de 2013.

Lula, por sua vez, faria muito bem ao Brasil apoiando uma candidatura como a de Ciro Gomes, por exemplo, que já provou no passado o seu preparo para exercer cargos eletivos. Indicando a vice de Ciro um nome como o do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, ou do ex-governador da Bahia, Jaques Wagner – ambos de muita qualidade e cotados como pré-candidatos a presidente – o PT conseguiria recolher-se mesmo estando no governo, ajudar na pacificação do país e empreender, enfim, reformas estruturais cuja execução Ciro afirma estar disposto a tornar realidade e que são de profundo interesse do Brasil.

Como dito, não creio que isso ocorrerá. O PT indicará a cabeça da chapa contra candidaturas de aliados e ex-aliados. Lula é o nome até este momento.

Diante disso, o Brasil parará amanhã para acompanhar o julgamento em segunda instância do ex-presidente. Sua condenação é imprescindível para que as reformas conservadoras possam continuar em execução por meio de um nome da centro-direita a ser eleito em outubro. O governo Temer e o PSDB apostam as suas fichas, até aqui, no governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Sua viabilidade eleitoral mostra-se, entretanto, duvidosa, o que pode alterar as peças do tabuleiro até que as candidaturas sejam oficializadas.

Venho lendo artigos de pessoas preocupadas com uma eventual condenação de Lula. Todo o escrutínio sobre a vida do ex-presidente resultou num apartamento em Guarujá, cujos registros não se encontram em nome de Lula. O nosso ordenamento jurídico determina que o registro público é a única maneira de se comprovar a propriedade de um bem imóvel no Brasil, e como não é o caso, buscou-se provar o recebimento de propina de outras maneiras – muito válido, é verdade. O problema é que, a despeito dos esforços, é constante a opinião de que a sentença proferida pelo juiz Sergio Moro é muito frágil.

Assim acham os colunistas Kennedy Alencar e Reinaldo Azevedo, este último um crítico ferrenho do PT e do ex-presidente. A classe política parece dizer o mesmo ao mostrar-se desejosa de enfrentar Lula “nas urnas”, conforme discursou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Pensam da mesma maneira as mais de 200 mil pessoas que assinaram o manifesto “Eleição sem Lula é Fraude”, dentre as quais o filósofo americano Noam Chomsky, o economista Luiz Carlos Bresser Pereira, a ex-presidenta argentina Cristina Kirchner, o ex-presidente uruguaio José Mujica, o cantor Chico Buarque, o teólogo Leonardo Boff, a sambista Beth Carvalho, e até de possíveis adversários de Lula nas eleições, como Manuela D´Ávila e Guilherme Boulos.

O jornal americano The New York Times publicou hoje minucioso artigo de opinião, assinado por Mark Weisbrot, no qual o autor se debruça sobre a situação do Brasil, as fragilidades da condenação e o pós-impeachment. Weisbrot classifica a possibilidade de um judiciário “politizado” impedir que um líder popular concorra à presidência como sendo “uma calamidade” para os brasileiros, a região e o mundo.

Sendo frágil a sentença de Moro, e muitos assim a avaliam, é preocupante para todos uma eventual condenação baseada em provas pouco robustas. Afinal, se um ex-presidente da República é alvo de semelhante despropósito, que segurança temos nós?

O ex-presidente Lula cumpriu no passado importante papel, antes e durante a presidência da República. Os avanços de seu governo são inegáveis a todos aqueles que não se encontram cegos pelo ressentimento. O ideal seria, porém, a emersão de novas lideranças de esquerda, dispostas a empreender reformas que nem Lula e nem Dilma Rousseff fizeram quando governaram o país. A qualidade dos adversários do ex-presidente pode fazer com que as pessoas prefiram reelegê-lo, é verdade – o que não se pode, entretanto, é impedi-lo de concorrer com base em uma condenação cujos argumentos não satisfazem a juristas e nem tampouco a setores importantes da população.

Está nas mãos dos magistrados de Porto Alegre a condenação de Lula. Se optarem por fazê-lo, que se utilizem do saber jurídico para apresentar ao país provas revestidas de robustez suficiente, de modo não serem contestadas por ninguém.

Talvez a nossa democracia não suporte o peso de mais uma sentença frágil a condenar a maior liderança política do pós-1988. Se Lula tiver de perder, que seja nas urnas, como disse bem o ex-presidente FHC. Dotaria o próximo governo de indiscutível legitimidade. Mas se for impedido de concorrer sem que o país seja convencido de que fez-se a justiça, não sobrará segurança jurídica para nenhum de nós.

Não sou adepto da teoria de que Lula deve ser candidato a qualquer custo – inclusive, acho que ele próprio deveria retirar-se da disputa, a fim de preservar a própria história e o próprio legado. Mas sem uma justificativa plausível, ninguém pode impedi-lo de concorrer.