Enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) liberta deputados e senadores que carregam malas de propina, a população mais pobre economicamente sofre com um super-encarceramento.

O Poder Judiciário do Brasil, que tem os mais altos salários do mundo, transformou o país na quarta maior população carcerária no mundo.

De acordo com dados oficiais, o Brasil possuía, em 2014, 622,2 mil pessoas presas, ou seja, a quarta maior população de custodiados do mundo, superado apenas por Estados Unidos, China e Rússia. Desse total, 36% estão presos sem julgamento. São 225 mil pessoas presas com prisão preventiva.

Segundo a socióloga Eli Narciso da Silva Torres, coordenadora do Observatório da Violência e Sistema Prisional, o excesso de aplicação da medida cautelar (preventiva) para a manutenção das prisões no Brasil contraria a própria legislação, quando diz que “a prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar”.

Ou seja, há uma cultura jurídica que descumpre a própria legislação, já que a privação da liberdade, do ponto de vista jurídico, deveria consistir em um instrumento de exceção penal, não a regra.

Para Eli Torres, que concedeu entrevista ao JU da Unicamp,  isso não significa que o judiciário deveria soltar os acusados de violação à ordem social, mas, sim, buscar meios mais inteligentes de resolver os conflitos sociais como, por exemplo, a aplicação de medidas alternativas à prisão.

Eli Torres e Gesilane Maciel José organizaram o livro Prisões, Violência e Sociedade: debates contemporâneos (Paco Editorial). O livro reúne resultados de investigações de pesquisadores da pós-graduação no país.

Veja outros pontos da entrevista:

Super-encarceramento

“Esse super-encarceramento [do Brasil] corresponde a 301 indivíduos presos para cada grupo de 100 mil habitantes. Num comparativo mais ampliado dos últimos 20 anos, pode-se afirmar que o número de presos cresceu a uma taxa média de 8,1% ao ano, na contramão do crescimento da população brasileira que, nesse período, foi em média de 1,2% ao ano”.

Usuários de drogas

“Vale lembrar que, do ponto de vista discursivo, esta “nova” política de drogas seria mais centrada na prevenção, atenção e reinserção social dos usuários de substâncias consideradas ilícitas e teria como objetivo “oficial” deslocar o usuário de drogas do sistema de justiça criminal para o sistema de saúde. Porém, a elevação dos índices de prisões por tráfico, demonstra que não foi o que aconteceu. Por exemplo, o livro analisa um estudo de caso referente a uma pessoa presa pelos policiais e condenada pelo juiz na cidade de São Paulo, em 2008, na região central da cidade. Ela não tinha antecedentes criminais, alegava ser camelô e portava no interior de sua bolsa 17 pedras de crack (exatamente 4,25 gramas) e R$ 73,00 reais. O juiz, na condenação, atribuiu a pena de 3 anos e 4 meses de prisão porque, segundo o juiz, o “indivíduo” não poderia provar a origem do valor encontrado pelos policiais, conforme a ocorrência registrada.

O caso é revelador ao elencar significados ao fenômeno do hiper-encarceramento da pobreza por drogas no Brasil. Remete, ainda, ao papel protagonista da polícia na efetivação do encarceramento e também, e não menos importante, evidencia a crença na centralidade da prisão, pois boa parte dos operadores do sistema de justiça criminal e de parlamentares reafirma a necessidade da pena de prisão nas interações com usuários e pequenos comerciantes de drogas”.

São Paulo

Na experiência paulista ocorreu um crescimento substancial da população encarcerada (de 60 mil em 1994 para 210 mil internos em 2014) e uma militarização dos dispositivos prisionais nas duas últimas décadas, dificultando, assim, o acesso dos pesquisadores. (Carta Campinas com informações de divulgação)