Por Rafael Moya

Rogerio Alves TV senado bento rodrigues

As barragens de rejeitos de mineração que se romperam em Mariana – MG, fazem parte da Mina de Germano, que integram o chamado Complexo Alegria, compondo a região do Estado chamada de quadrilátero ferrífero. Muito ferro já foi explorado dali e ainda há muito com potencial de ser retirado. A atividade mineradora é impactante por si. Desde a extração, os rejeitos, o transporte, tudo é perigoso e danoso ao meio ambiente, seja no solo, no ar, na água, para a flora, fauna e socialmente nas comunidades que interagem.

As primeiras perguntas que surgem são: Para onde esse ferro era exportado? Para quê é exportado? A resposta é: para produzir bens de todo o tipo, alguns necessários, muitos outros nem tanto. Ferro em grande medida para abastecer um modelo de consumo irresponsável e estimulado initerruptamente quase no mundo inteiro. Quantos de nós, consumidores, efetivamente nos preocupamos com a reciclagem de materiais que poderiam reduzir a quantidade necessária de ferro extraído? Assim, a cada produto que adquirimos, ou não reciclamos, podemos ser clientes indiretos da Samarco (empresa da Vale e da anglo-australiana BHP-Billiton). Enquanto consumidores também temos nossa parcela de culpa.

Nosso modelo econômico alicerçado em um capitalismo agressivo, refém historicamente de exportações de commodities também tem sua responsabilidade. Em 2015 a mineradora era a décima maior exportadora do Brasil, com clientes em mais de 20 países. Não é preciso dizer a importância dessa empresa para o modelo econômico do país. Quantos teriam coragem de questionar a necessidade de uma empresa dessa sob nossas atuais bases macroeconômicas? Quantos de nossos representantes políticos ousariam dizer que a carga tributária sobre mineração de ferro é muito baixa em comparação a outros setores da economia, não chegando a 20%? Quantos de nós nos preocupamos em rebater o argumento de que a atividade mineradora gera empregos e divisas ao país, sendo que poderíamos ter um modelo econômico mais justo e sustentável do ponto de vista socioambiental, gerando empregos e divisas em setores da economia que gerem impactos positivos?

Quanto ao papel do poder público é flagrante a (ir)responsabilidade. Desde que assumi a presidência do Conselho de Meio Ambiente de Campinas – COMDEMA, venho insistindo na necessidade de investirmos em processos mais efetivos de licenciamento ambiental e estruturação de órgãos fiscalizadores. O sucateamento de órgãos ambientais é a regra no Brasil todo, em todos os níveis da federação. Defesa do meio ambiente ainda é vista como perfumaria pelo conjunto da sociedade e, por tabela, por nossos governantes eleitos. Quando o Poder Executivo envia uma lei orçamentária para o Legislativo não garantindo recursos adequados para os órgãos ambientais e os parlamentares chancelam isso, todos estão se responsabilizando com tragédias como a de Mariana. O ministro de Minas e Energia mesmo admitiu que o DNPM (órgão do governo federal responsável também por fiscalização) só gastou 13,2% do valor previsto em fiscalização, por, pasmem, contingenciamento. Ou seja, fazer superávit primário é mais importante do que fiscalização de barragens, segundo o governo Dilma. O governo do Estado também foi negligente, pois o último laudo para empresa era de julho e continha dez recomendações à mineradora, que deveriam ter sido iniciadas em setembro, como reparar trincas e recompor canaletas. Mas a fiscalização só seria feita pelo governo estadual em dezembro deste ano. As licenças das barragens de Germano e de Santarém, estão lá, para análise. As mesmas haviam vencido em 2013. Não é difícil imaginar que os prefeitos da região, na sua maioria de cidades pequenas, nas quais empresas como essa têm forte influência, deviam ficar ciceroneando os executivos das empresas e sequer imaginaram afrontar a galinha dos ovos de ouro, que enchem os cofres dos municípios e os mesmos nada investem em suas respectivas cidades. Se olharmos para as doações eleitorais que a Vale faz aos principais partidos do país, aí o cheiro ficará pior que os peixes podres à beira do Rio Doce.

Que todos os responsáveis, do setor público e privado, sejam punidos. Mas que possamos utilizar nossa indignação – não para malharmos meia dúzia de judas, que sim devem responder na medida de suas responsabilidades – para que esse terrível resultado de nossas escolhas como sociedade, que reverberará por décadas, faça com que avancemos e possamos construir modelos políticos e econômicos que garantam um futuro para as presentes e futuras gerações. (Do Observatório da Gestão Pública)

Rafael Moya é advogado e presidente do Congeapa – Campinas