A Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) tem 223% mais estudantes do que o MIT (Massachusetts Institute of Technology).

Enquanto a famosa universidade norte-americana tem 11.300 estudantes de graduação e de pós-graduação, a Unicamp possui 35.600. Mas a universidade brasileira tem menos da metade do orçamento do MIT.

Os dados estão em artigo do reitor da Unicamp, Marcelo Knobel, em parceria com  Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp, e Fernanda Negri, do Ipea. No artigo, os pesquisadores mostram a importância do investimento do Estado no desenvolvimento científico e relatam que, em qualquer país do mundo, é o Estado o maior financiador de universidades, sejam públicas ou privadas.

“As melhores universidades do mundo, além do ensino, produzem pesquisa de alta qualidade e impacto, com benefícios sociais e econômicos acima de seus custos. Por isso o Estado é um dos seus principais financiadores. No MIT, os contratos de pesquisa e subvenções do governo norte-americano são a principal fonte de receitas da instituição: 67% do total para pesquisa no quinquênio 2011-2015.”, relatam. Veja o artigo completo:

Excelência acadêmica requer custeio público

.Por Fernanda de Negri, Marcelo Knobel e Carlos Henrique de Brito Cruz.*

A crise fiscal dos Estados e da União e de várias universidades importantes tem suscitado um debate sobre modelos de financiamento da universidade e da pesquisa científica no País. O debate é bem-vindo, assim como a proposição de alternativas que possam impulsionar a formação de pessoas e a produção de conhecimento no Brasil.

Várias universidades de ponta pelo mundo, públicas ou privadas, têm fontes de receitas mais diversificadas (doações, fundos patrimoniais e mensalidades, entre outras) do que as universidades públicas brasileiras. Mesmo assim, quem mais paga pelos custos das grandes universidades do mundo, sejam elas públicas ou privadas, continua sendo o Estado.

Endowments são fundos patrimoniais, em geral provenientes de doações, comuns nas universidades norte-americanas. As receitas de tais fundos usualmente cobrem algo como 5% das despesas anuais. As mensalidades, por sua vez, também não são, por si sós, a solução, pelo menos não para universidades de pesquisa. No Massachusetts Institute of Technology (MIT), por exemplo, elas equivalem a cerca de 10% das receitas.

O mesmo vale para recursos de pesquisa oriundos de empresas, que no MIT são cerca de 5% da receita anual. Na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) têm ficado próximos de 3% nos últimos anos. Nenhuma diferença abissal aqui.

As melhores universidades do mundo, além do ensino, produzem pesquisa de alta qualidade e impacto, com benefícios sociais e econômicos acima de seus custos. Por isso o Estado é um dos seus principais financiadores. No MIT, os contratos de pesquisa e subvenções do governo norte-americano são a principal fonte de receitas da instituição: 67% do total para pesquisa no quinquênio 2011-2015. Em Oxford, cerca de 50% das receitas vêm do governo. Na Alemanha, onde as universidades são, em sua maioria, públicas, esse porcentual é ainda maior. Na Universidade Tecnológica de Munique, por exemplo, mais de 60% das receitas correntes são provenientes do governo.

Quando se fala no financiamento da pesquisa, o papel do Estado é ainda maior. Na Inglaterra, estima-se que 66% dos recursos de pesquisa das universidades sejam provenientes diretamente do governo inglês e outros 11%, indiretamente, venham da União Europeia.

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As boas universidades no Brasil custam pouco, caro mesmo é não saber criar conhecimento
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No Brasil, as fontes de receitas não são tão diversificadas como em outros países. E também é verdade que nossas melhores instituições custam relativamente pouco ao Estado brasileiro. Uma comparação entre a Unicamp e o MIT, duas universidades de excelência em seus países e com grande vocação para a produção de tecnologia, evidencia esse fato. A Unicamp tem, somando repasses do governo do Estado e receitas extraorçamentárias, uma receita anual, em paridade do poder de compra, de cerca de US$ 1,1 bilhão, menos da metade da do MIT.

Acontece que o MIT possui 4.500 estudantes de graduação e 6.800 de pós-graduação, enquanto a Unicamp tem 19 mil alunos de graduação e 16.600 estudantes de pós-graduação. O número de professores, por sua vez, é praticamente igual, pouco menos de 1.900 docentes nas duas instituições, e o número de funcionários técnico-administrativos é um pouco superior no MIT. A Unicamp tem mais que o triplo dos estudantes, com metade do orçamento e o mesmo número de funcionários e professores, sendo um dos mais importantes centros de pesquisa no País.

O volume de recursos que o MIT recebe a mais do que a Unicamp é, provavelmente, o que faz a instituição norte-americana ser uma das melhores universidades do mundo. Esses recursos são investidos em novos centros de pesquisa, laboratórios e equipamentos e na contratação temporária de pesquisadores. Os pesquisadores estagiários de pós-doutorado no MIT são mais de 5 mil, enquanto na Unicamp são apenas 270. Esses profissionais são definitivos para fazer a máquina de pesquisa do MIT funcionar tão bem. Ainda assim, a Unicamp é a universidade brasileira com o maior número de patentes solicitadas ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).

Pesquisa científica é essencial não apenas para estimular a inovação e o crescimento econômico, mas também para resolver questões críticas do nosso desenvolvimento. Novas vacinas e novos tratamentos para doenças que afetam a população brasileira, tecnologias capazes de ampliar a produtividade agrícola e industrial, conhecimento capaz de mitigar os efeitos do aquecimento global sobre a nossa produção agropecuária são alguns dos exemplos. E é o Estado o grande financiador da ciência no mundo todo. Já a inovação exige investimentos empresariais.

As boas universidades no Brasil estão cada vez mais abertas às demandas da sociedade, incluídas aí as empresas. Precisam, além disso, buscar alternativas de financiamento e demonstrar transparência e visibilidade sobre os custos e resultados. Também precisam estar atentas às necessidades de uma das sociedades mais desiguais do mundo. Afinal, é o conjunto da sociedade que define, e assim deve ser numa democracia, os recursos que serão alocados para o ensino superior e a pesquisa científica.

As boas universidades no Brasil precisam e podem mostrar à sociedade que custam pouco, considerando sua qualidade e seus resultados. Precisam modernizar a gestão do orçamento, criando mecanismos internos de controle que permitam que as decisões sejam compartilhadas, transparentes e consistentes com nossa realidade econômica, demonstrando à sociedade os custos e impactos. E o Brasil precisa definir quantas boas universidades intensivas em pesquisa e ensino consegue manter em condições competitivas internacionalmente, considerando que caro mesmo para um país é não saber criar conhecimento. (Da Unicamp/ grifos Carta Campinas)

* Fernanda de Negri é técnica do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), Marcelo Knobel é reitor da Unicamp e  Carlos Henrique de Brito Cruz é diretor científico da Fapesp.