Uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) mostrou que os pais que conseguem ser exigentes no cumprimento de regras e que monitoram constantemente as atividades dos filhos – buscando saber onde estão, com quem e o que fazem – têm menor risco de enfrentar problemas relacionados ao abuso de álcool e de outras drogas na adolescência.

Os riscos de problemas se tornam ainda menores quando, além de monitorar e cobrar, os pais também abrem espaço para o diálogo, explicam o motivo das regras e se mostram presentes no dia a dia dos filhos.

Segundo Zila Sanchez, professora da Escola Paulista de Medicina (EPM-Unifesp) e coordenadora da pesquisa, a principal conclusão do estudo é que o modo como os pais educam seus filhos, pode ser um fator de proteção ou de risco para o consumo de álcool e outras drogas na adolescência. “Isso significa que os programas escolares de prevenção devem, além de conscientizar as crianças, também se preocupar em treinar habilidades parentais”, disse Zila Sanchez.

Os dados foram coletados em 62 escolas públicas das cidades de Tubarão (SC), Florianópolis (SC), São Paulo (SP), São Bernardo do Campo (SP), Fortaleza (CE) e Brasília (DF). Participaram do levantamento estudantes de 7º e 8º anos do ensino fundamental. A idade média dos entrevistados foi de 12,5 anos.

“Optamos por trabalhar com jovens que haviam acabado de entrar na adolescência para avaliar se, nessa fase, o estilo parental já estava influenciando o consumo de substâncias. Entretanto, como ainda são muito jovens, a prevalência de consumo ainda é baixa. Por esse motivo, consideramos no questionário quem havia feito uso ao menos uma vez no último ano”, explicou Sanchez.

Os questionários foram preenchidos pelos próprios adolescentes, sem a presença do professor, e depositados anonimamente em envelopes pardos – de modo a evitar inibição e constrangimento. Além de perguntas sobre o uso de drogas, também foram incluídas questões sobre o estilo parental (como os jovens percebiam os pais), condições socioeconômicas, comportamento sexual e violência escolar, entre outras.

Por meio de um modelo estatístico conhecido como análise de classes latentes, foi possível dividir os entrevistados em três grupos de uso de drogas. A mais prevalente, com 81,54%, foi a classe dos “abstinentes/usuários leves”. Em seguida, com 16,65%, vieram aqueles considerados “usuários de álcool/bebedores pesados”. Por último, com 1,8%, os “poliusuários”, ou seja, aqueles que, além de álcool, usaram no último ano substâncias como tabaco, maconha, cocaína, crack ou inalantes (benzina e cola de sapateiro, por exemplo).

O passo seguinte foi avaliar se os estilos de educação dos pais estava associado a algum desses três perfis de consumo. “Para isso, os pais também foram classificados em quatro tipos diferentes – segundo a avaliação dos adolescentes e critérios estabelecidos na literatura científica”, explicou Sanchez.

Com base em uma escala de avaliação consagrada em estudos internacionais e validada no Brasil, os perfis dos pais foram classificados de acordo com dois domínios principais: “exigência” – o quanto os pais monitoram as atividades dos filhos e demandam o cumprimento de regras – e “responsividade” – o quanto são sensíveis às demandas dos filhos e abertos ao diálogo.

Pais com pontuação alta nos dois domínios foram classificados como “autoritativos”. Aqueles com escore alto apenas no domínio da exigência foram classificados como “autoritários”. Pais responsivos, mas que não monitoram as atividades dos filhos ou não se apegam a regras foram considerados “indulgentes”. Por último, aqueles com escore baixo nos dois domínios foram classificados como “negligentes”.

De modo semelhante ao observado em estudos internacionais, o estilo “autoritativo” foi o mais protetor, seguido pelo “autoritário” e, na sequência, pelo “indulgente”. Como ressaltaram os pesquisadores no artigo, os pais “negligentes” são os que colocam os adolescentes em maior risco de pertencer às duas classes de usuários de drogas encontradas no estudo: usuários de álcool/bebedores pesados e poliusuários.

Adolescentes ricos bebem mais

Um dado que chamou a atenção do grupo da Unifesp foi que, quanto mais alta era a classe social do entrevistado, maior era a probabilidade de pertencer aos grupos de bebedores pesados ou poliusuários. De acordo com Sanchez, o achado contraria dados de estudos norte-americanos e europeus, onde a pobreza é considerada um fator de risco para o uso de álcool e drogas na adolescência. Porém, vai ao encontro de dados brasileiros anteriores para a mesma faixa etária.

“Esse dado é bem curioso e mostra que não podemos simplesmente importar dados relacionados a fatores de risco e proteção para programas de prevenção de uso de drogas, sem considerar diferenças culturais”, disse Sanchez.

A  pesquisa foi realizada com 6.381 jovens de seis cidades brasileiras. Os resultados acabam de ser publicados na revista Drug and Alcohol Dependence. A coleta dos dados ocorreu no fim de 2014, no âmbito de um projeto financiado pelo Ministério da Saúde. A equipe da Unifesp foi escalada pelo órgão governamental para avaliar nas 62 escolas selecionadas a efetividade de um programa de prevenção ao uso de drogas intitulado #Tamojunto. (Com informações de divulgação)