.Por Verônica Lazzeroni Del Cet.
Fotos de Júlia Moretzsohn

A poesia nem sempre é vista como uma leitura acessível. Para alguns, o gênero literário é difícil, chato e distante da realidade, ainda mais por tratar com tanta preocupação a subjetividade. Para outros, é maravilhoso. Apesar da relação de “amor e ódio” que vários leitores e estudantes têm com o gênero poético, a ideia de criar no leitor a percepção de que poema pode fazer parte do cotidiano e de que a interação com ele acontece foi uma das ideias que orientou e ainda orienta o projeto Ponto Poema.

O Ponto Poema faz parte do Programa Aluno-Artista criado em 2010 pela Pró-reitoria de Graduação da Unicamp. O programa anual possibilita aos alunos com talentos artísticos, independente do curso de graduação, a exposição e divulgação de suas artes, sendo que o objetivo é estabelecer interação entre público e objeto artístico.

Cada edição do Ponto Poema dura oito meses e chega ao fim no próximo mês de novembro. A equipe é composta por três integrantes:  Tina Zani, , Nicholas Zani e Júlia Moretzsohni.

Desde abril – mês do início do projeto – a proposta principal do Ponto Poema é trabalhar poesia dentro de uma linguagem artística e com pensamento no que é atual. “Nosso projeto tem caráter de observação. A nossa ideia é observar o que está acontecendo ao redor”, diz Tina Zani, estudante de estudos literários e que é uma das integrantes do projeto. Ela ainda complementa: “é a área da literatura casada com artes”.

Além disso, por tratar também a linguagem artística como parte importante das propostas desenvolvidas, o objeto que o Ponto Poema divulga recebe nome de objeto artístico. “Nem sempre são poemas. Às vezes é um objeto poético que é uma imagem, um desenho, um livro de artista”, diz Tina Zani.

O projeto oferece um olhar poético até mesmo para a intervenção artística que pratica no ponto de ônibus, um dos locais em que ‘ponto poema’ se faz presente. Toda quarta-feira é apresentado ao público uma nova intervenção, podendo estar no ponto de ônibus do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) ou na Praça da Paz, também localizada na Unicamp.

Intervenção no ponto de ônibus

Toda semana, o ponto de ônibus recebe alguma intervenção artística nova do projeto. “O ponto de ônibus é um lugar onde têm muita gente. As pessoas ficam paradas, esperando. É um espaço interessante para ser explorado, porque possibilita uma interação com o público. Faz da espera algo legal”, afirma Nicholas Zani, estudante de biologia e participante do projeto. Nicholas ainda destaca o fato de que a poesia fixada no painel interativo no ponto de ônibus chama atenção não só de quem aguarda o ônibus, mas do pedestre que atravessando a rua tem contato também com o Ponto Poema.

Uma das propostas idealizadas pelo projeto foi justamente fazer com que o objeto poético participe do cotidiano das pessoas e o ponto de ônibus é “um lugar que está inserido no cotidiano”, comenta a outra participante, Júlia Moretzsohn, estudante de midialogia e responsável pelas fotografias não apenas dos trabalhos semanais do projeto, mas também registrando com fotos as oficinas que o projeto oferece, esporadicamente, dentro ou fora do campus universitário, ajudando a divulgar o Programa Aluno-Artista, como também o próprio Ponto Poema.

O poema e o contato com o cotidiano do público

Um dos objetivos e talvez o principal do projeto é oferecer, a partir dos painéis interativos, a chance de criar no cotidiano do público leitor o seu contato com a poesia, mostrando que ela não é chata ou complicada, mas parte da realidade diária e no caso do Ponto Poema, parte da realidade semanal.

Para atender a proposta e “conversar” com a relação público-poema, os participantes oferecem oficinas para quem desejar participar. É proposto para quem participa das oficinas não somente produzir um objeto artístico com teor literário – sendo o poema a forma de estabelecer a conversa entre gênero literário e cotidiano do público – mas também modificar o estado de quem estiver produzindo e que de quem estiver lendo posteriormente a poesia no ponto de ônibus.

Para isso, a oficina produz, por exemplo, cartas ou cartões postais com poemas. Após a realização, uma seleção de cartas ou poemas, a partir da leitura dos idealizadores do projeto, acontece e, então, algumas podem aparecer em algum painel interativo que será levado a locais públicos. “Também colocamos produções poéticas de oficinas nos pontos. Produções anônimas ou assinadas de pessoas comuns”, afirma Tina Zani.

O projeto possibilita ao leitor não somente o contato com o objetivo artístico, mas também que leve consigo ou deixe algo de si, caso assim desejar. “A pessoa pode levar as cartas e presentear alguém, ou levar as cartas para ela própria”, diz Tina Zani.

Além disso, os membros do projeto acreditam que a resposta do público é esperada e boa, uma vez que muitos deixam recados de agradecimentos e se envolvem com a poesia, levando uma parte do poema com eles.

Toda semana, o projeto fixa nos pontos intervenções poéticas diversificadas, usando painéis interativos e coloridos para chamar a atenção do público. Um exemplo dessas intervenções são os “poemas voadores”, que ao serem embalados pelo vento acabam provocando uma forma diferente de se ler poesia.

Recepção do público e planos futuros

As oficinais realizadas são uma forma válida de fazer do contato da poesia com quem a produz, algo diferente do contato que alguns alunos podem ter inicialmente quando estudam poesia na escola. O envolvimento nas oficinas é notável. “Eu fotografo as pessoas e consigo perceber como elas estão focadas, empenhadas. Às vezes elas têm alguma prova, mas naquele momento estão concentradas naquela atividade”, diz Júlia Moretzsohn.

Um diferencial também que acaba oferecendo ao projeto exclusividade é com relação à produção de tais objetos artísticos. “As intervenções são feitas à mão. É uma produção única, não em série”, conta Tina Zani.

Aliado a isso, o que é importante também destacar é com relação ao formato que os participantes das oficinas escrevem suas poesias. Nicholas Zani comenta que há preocupação com a forma, mas muitos dos que participam das oficinas tentam fugir do padrão. “Eles escrevem poesia, mas também muitos deles ilustram”, ressalta Nicholas.

A manifestação do público não somente tem sido o que guia o projeto ao longo dos oito meses em que esteve sendo aplicado semanalmente, mas também revela algo que seja o maior legado do Ponto Poema: o de mudar o olhar do outro a respeito da poesia, mostrando que a sua relação com o cotidiano pode ser extremamente forte e usual.

Júlia Moretzsohn, Nicholas Zani e Tina Zani

Criar no público a sensação de que a poesia é para ser parte do cotidiano sempre. “Toda quarta-feira colocamos algo no ponto, as pessoas ficam esperando”, diz Tina Zani. Dessa forma, o público percebe que a relação com o poema é tão bom quanto à sensação de esperar por mais uma quarta-feira, mudando antigas ideias sobre a poesia. “Comecei a participar do projeto e fui entendendo a complexidade de algumas poesias e como isso fazia dela algo especial. E até as poesias simples são bonitas”, comenta Nicholas Zani. O estudante ainda destaca que generalizar o fato de que poesia é complicada pode começar quando o primeiro contato vem da leitura de livros de poesia que compõem a lista de vestibulares brasileiros.

O projeto no formato que vem sendo exposto se encerra em novembro, mas os participantes afirmam que não precisa ser o fim. “Não sabemos o rumo, mas a intensão é buscar novos apoios e participar de novos projetos, como o da Ação Cultural”, comenta Tina Zani. Ponto Poema já participou de exposições, esteve em diferentes locais e ainda assim permanece sonhando com novas etapas e com o desejo de fortalecer a relação entre poesia e público.

Para mais fotografias das oficinas e poemas do Ponto Poema
Para conhecer melhor o projeto é possível acessar a página no Facebook ou entrando no site